Na última sexta-feira (05), dia em que se completam 6 anos do rompimento da barragem de Fundão, pessoas atingidas e movimentos sociais manifestaram por Justiça e memórias às vítimas, em Mariana.
Pela manhã, o ato liderado pelo Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB) na Praça Minas Gerais marcou o encontro das pessoas atingidas pela barragem da Samarco, em Mariana, e da Vale, em Brumadinho. Andressa Rodrigues, vice presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem Mina Córrego Feijão em Brumadinho (Avabrum), entoou um grito de presença às 20 vítimas do rompimento de Mariana e às 272 pessoas que perderam a vida em Brumadinho, dentre elas, seu filho, Bruno Rocha Rodrigues. “Segue hoje completando seis anos de impunidade aqui em Mariana e três anos de impunidade em Brumadinho. E aí eu pergunto: quem será a próxima vítima agora?”
Dentre as pautas levantadas no ato, a principal é o atraso no processo de reparação dos danos sofridos pelas pessoas atingidas. Jerônimo Batista, morador de Paracatu de Baixo, ainda aguarda pelo direito de ter de volta uma casa, já que a sua foi levada pela lama de rejeito. “Em seis anos que estamos sofrendo a gente não tem moradia ainda. Lá em Paracatu iniciou-se duas casas até o momento. Só o início, não fizeram nada até agora. Sou atingido de Paracatu diretamente, porque eu morava próximo do rio. Se eu tivesse dormindo a noite, na hora que a lama chegou, eu tinha ido embora também e não estaria falando agora com vocês”. As duas casas citadas por Jerônimo fazem parte do primeiro pacote de obras anunciado pela Fundação Renova, empresa contratada para gerir o processo de reparação, no evento simbólico de colocação do primeiro tijolo no reassentamento coletivo de Paracatu de Baixo, em setembro deste ano. Ao todo, 97 casas deveriam ter sido entregues em 27 de fevereiro de 2021, terceiro prazo estipulado pela Justiça para a conclusão de todo o reassentamento e mais um vez descumprido pela Renova. Até o momento, nenhuma casa foi construída e não há uma nova data prevista para o término das obras.
Estiveram presentes no ato também os movimentos sociais Levante Popular da Juventude, Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), assim como representantes de Assessorias Técnicas e moradores da região.
No caminho do território
Ao contrário de Paracatu de Baixo, as obras do reassentamento coletivo de Bento Rodrigues já apresentam maior volume. Ao menos aparentemente. Das dez casas construídas, algumas, condensadas em uma região específica do reassentamento, já foram até pintadas. O ângulo da região escolhida favorece a narrativa de avanço das obras. Contudo, o contraste das demais construções ao redor, algumas ainda sequer iniciadas, demonstra a real proporção do reassentamento: O retorno das pessoas atingidas para suas casas é ainda uma promessa distante.
Diferente das obras, o acesso ao território atingido de Bento Rodrigues não parece ter sido preparado para receber visitas neste dia 05. A estrada em péssimas condições é um empecilho para os moradores que continuam frequentando a comunidade e dificultou a chegada daqueles que acompanhavam os atos.
Missa em memória às vítimas
Por volta de 16h, foi a vez da Igreja de Nossa Senhora das Mercês, a única capela que resistiu à lama em Bento Rodrigues, receber a comunidade e demais grupos que acompanhavam os atos. Antes da celebração, as pessoas atingidas protestaram erguendo cruzes com os nomes das vítimas em frente ao altar. A missa foi ministrada em conjunto por Dom Airton, Arcebispo da Arquidiocese de Mariana, Dom Lauro Versiani Barbosa, bispo da Diocese de Colatina (ES), Dom Vicente Ferreira, bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, e pelos Padres Marcelo e José Roberto, de Mariana.
Momento de fé e emoção, a missa foi marcada também por discursos de membros da comunidade. Com uma fala comovente, Mônica dos Santos, moradora de Bento Rodrigues, apresentou uma carta enviada pela Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF) ao Papa Francisco, como um pedido para que o pontífice interceda pela causa. Em outro momento, foi entregue aos padres uma cesta com produtos cultivados no território, como doces caseiros, conservas de legumes, a tradicional pimenta biquinho e o primeiro vinho de jabuticaba produzido após o rompimento. “A intenção era dar alguma coisa que representasse a nossa comunidade, as nossas terras, um gostinho do que é o Bento. E também pra mostrar pro mundo que aquelas terras são nossas, que elas têm donos e que aquelas terras continuam produzindo”, explica Mônica dos Santos. O presente é uma forma de defender que as terras afetadas pelo rejeito ainda são férteis, em contraponto aos estudos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que apontam contaminação por metais pesados no solo dos territórios atingidos. Os moradores defendem ainda que esta é uma prova de que o território de Bento Rodrigues pode ser habitado por eles.
Presenças políticas
Toda a programação foi acompanhada pelos deputados federais Rogério Correia (PT) e Padre João (PT), e pela deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT). Cristiano Vilas-Boas (PT), foi a única figura política local a acompanhar os atos.
Por Joice Valverde, para o Diário de Ouro Preto