O julgamento do Caso Inglês Mariana está em andamento e busca uma reparação e uma punição justa em relação ao rompimento da Barragem do Fundão em 5 de novembro de 2015. A empresa BHP é julgada por um dos maiores crimes socioambientais do mundo. A sentença será divulgada somente em 2025, uma vez que o processo passará por várias etapas durante esse tempo.
Em cronograma publicado pela empresa de advocacia Pogust Goodhead, responsável por defender os atingidos de Mariana, é possível entender como será o processo do julgamento:
- 21/10 a 24/10/2024: Tem início o julgamento com as declarações iniciais das partes durante a primeira semana. Falam os representantes dos autores e os representantes da BHP.
- 28/10 a 14/11/2024: Interrogatório das testemunhas da BHP.
- 18/11 a 19/12/2024: Vão ser ouvidos os especialistas em Direito Civil, Societário e Ambiental brasileiros.
- 20/12/2024 a 13/01/2025: Recesso da corte inglesa.
- 13/01 a 16/01/2025: Vão ser ouvidos os especialistas em questões geotécnicas (e de licenciamento).
- 17/01 a 23/02/2025: Preparação dos argumentos finais das partes envolvidas no processo.
- 24/02 a 05/03/2025: Apresentação das alegações finais.
- Meados de 2025: Divulgação da sentença.
Mônica Santos, moradora de Bento Rodrigues e membro da Comissão dos Atingidos relatou ao Diário de Ouro Preto quais são suas expectativas em relação ao julgamento: “A expectativa é que a BHP seja responsabilizada pelo crime que ela, como dona da Samarco, cometeu em 5 de novembro de 2015, que os responsáveis sejam punidos e que paguem por todo o sofrimento que nos causaram nesses 9 anos. Infelizmente dinheiro não vai trazer a vida das pessoas de volta e nem as coisas que perdemos, porém é uma forma de se fazer a justiça, quem sabe com o desfalque nos cofres eles aprendam a minerar com responsabilidade e respeitando a vida e o meio ambiente. Não precisamos dessa mineração predatória, essa mineração que mata. Independente do valor que as empresas me pagarem por todas as minhas perdas e sofrimento, elas sempre vão estar em débito comigo.”
Simone Silva, moradora de Gesteira (Barra Longa), está em Londres acompanhando o julgamento de perto. Ela relatou ao Diário como está sendo o processo: “É uma sensação inexplicável, você poder estar aqui, entrar na corte, ver as coisas acontecendo lá dentro. Por exemplo, quando a gente estava na porta, a gente viu os nossos processos, as nossas vidas passando em caixas, as caixas entrando, né? (…) É uma sensação, assim, inexplicável, de empoderamento, de vontade de lutar muito mais. Apesar das guerras que nós temos vivido ao longo desses anos, do governo federal, Lula e os governos estaduais, e as instituições de justiça estão contra os atingidos, isso nos dá mais força para lutar. Isso nos encoraja muito mais a seguir lutando. Só que agora já não era uma luta fácil, agora é uma luta ainda pior, porque agora nós vamos lutar contra o governo. Nós vamos lutar contra os governos.”
Simone também declara sua indignação quanto à Repactuação do Acordo de Mariana: “Mas agora eu estou falando, 2026 é logo ali e nós não vamos esquecer nenhum desses deputados, nós não vamos esquecer o presidente Lula, nós não vamos esquecer os governadores dos estados, nós vamos dar o troco, se Deus quiser, em 2026, porque é revoltante. Nove anos de crime, nove anos de impunidade, nove anos sem reparação na saúde, nove anos sem tratamento, nove anos perdendo os nossos entes queridos. E vem o governo Lula, que no passado criticou tanto uma caneta bic, pega essa caneta e acaba com a vida dos atingidos, retira o direito dos atingidos, mata o restante dos atingidos da bacia. É muito triste porque essa repactuação vai adoecer e vai matar muito mais pessoas.”
Simone ainda detalhou como está na Inglaterra: “Aqui em Londres, nós temos muita esperança, muita esperança do verbo Esperançar, que aqui as coisas vão dar certo, aqui as coisas vão acontecer, aqui nossos direitos vão ser ouvidos. Eu tive a oportunidade de estar indo no Parlamento Europeu falar, eu e os demais atingidos, que tivemos a oportunidade, porque não é só a Simone Silva que está aqui, tem outros atingidos aqui, tem outras lideranças de território aqui, aqui nós temos lideranças indígenas, aqui nós temos as mães das vítimas, das crianças, aqui nós temos esposa, aqui tem duas lideranças quilombolas comigo, eu sou liderança da comunidade quilombola de Gesteira. E nós não vamos desistir, nós vamos continuar acreditando na justiça internacional, na corte internacional, porque o governo e as instituições de justiça conseguem provar que o Brasil é incapaz de fazer justiça. O Brasil é incapaz de trazer o direito das suas vítimas.”
O chefe de Gabinete da Prefeitura de Ouro Preto, Zaqueu Astoni, está em Londres acompanhando o julgamento da ação contra a BHP. Ele que é advogado está representando o município. “Estou aqui na Inglaterra representando a nossa cidade, sem custo para o município, no julgamento final do caso Samarco, o grande julgamento aguardado por todos. A maior causa em tramitação numa corte europeia. Agora o processo chega na sua fase final, com a produção de provas, oitiva de testemunhas e finalmente, a sentença, onde Ouro Preto pode ter devida e justa reparação. Tivemos perdas de vida humana, grandes prejuízos ambientais, sociais e econômicos e Ouro Preto está aqui buscando justiça e que a nossa cidade seja reparada, por tudo que sofreu nesse grave e essa grande tragédia ocorrida em nossa região”.
Segundo Zaqueu, “a expectativa é muito positiva junto à ação inglesa. No processo já existem evidências de que a BHP sabia do risco da barragem, e não tomou nenhuma providência para sanar a situação”.
Por Marcella Torres
Foto: Audiência Pública no Parlamento Britânico – Zaqueu Astoni