Por Chiquinho de Assis

Lá vai Vandico, o nosso maioral. Lá vai Vandico, na segunda de carnaval. Lá vai Vandico, deixando centenas de canções, quadros, poesias e crônicas. Lá vai Vandico, o homem que deslizou as ladeiras enquanto a noite brincava com lua no céu, nos exortando a descansar, pois no dia seguinte ainda haveria muita orgia rolando no ar.


Vandico da Charanga de Carlota e o que dirá Zé meu Zé? Dona Dina marca a presença. Afinal, Vandico os flagrou em camisa de manguinha, com o embrulhinho redondinho anunciando: o filme é na alcova da rainha que oferece a carinha para o rei ensaboar, onde as duas criaturinhas tralalalalalalalá…


Ah Vandico, cronista às avessas do Mercosul. Minhocuçu, Surucucu e Cascavel, sua irreverência, sinalizando que alguns só de ver queima a história e que em homenagem ao sossego um vendaval de avião aqui roncou, em meio a festança para a pança do povão nada sobrou


Sigo a caminhar por nossas ladeiras, ouço tua voz, que seguirá viva em nós. Escuto no eco da história: é delein, é delein, é delein, dein… advinha, advinha quem lá vem? É tropeiro rodando a cidade, sobe ladeira, desce ladeira, ah que canseira chega de andar, na encardeira, as lavadeiras ficam esperando ele passar. E o que ele diz? Ora ora sá dona, ora ora sinhá, sinhô rei mandou ordem pra se apresentar.


Mas quem vem lá, quem vem lá, quem vem lá? Abram alas pro Aleijadinho passar.
Tudo isso era no tempo do carná na rua São José, parecia até enchente da maré. Ou bem antes, em 1711 quando os primeiros arrais foram criados.


Vandico foi além, percorreu nossas serras, viu mãe preta lá no alto do Morro e o seu leite igual tesouro jorrando sem ter fim, e o povo na delícia da magia, seio, líquido corria dando vida ao seu senhor.
O poeta desceu inspirado e desde então elaborava os muitos discursos do Judas, lidos antes das chamas consumir o boneco que ele fazia questão de esculpir, de decorar, de encher de bombas e rojões. Tudo ao ar, balas e doces aos céus, meninada feliz. Um vagabundo qualquer sem filho e sem mulher…

Normex, Trex, autor de expressões
Pena de morte para quem peidou debaixo da coberta do doutor…
Vandico folião, protestou. Deixa de mutreta pra cima de muá. Não teve carnaval? Não vai ter candonguêro? Vou me embora – sentenciou.


Vai Vandico. Você que chegou ao mundo na semana do natal, vai embora no carnaval. Vai Vandico, encontre os teus, abrace Pedro seu irmão, que deve estar feliz com o reencontro. Veja se mesmo lá em cima João Pé de Rodo, ainda arrasta o pé e segue se escorando e fazendo riscos nas paredes celestiais. Pardal, o nosso locutor, anunciará a tua chegada. Pra te receber estará na perna de pau. Encontre aí seu Walter das Latinhas, ele deve ter composto música nova lá em cima, dê um abraço nele por mim, explique que não conseguimos fazer juntos a nossa música em homenagem a ele, o tempo foi curto e voou.


É Vandico, eu aqui, agradeço a você por tudo mestre, pela poesia, pelo carinho, pelos goles e gargalhadas.
Agradeço ao Victor de Godoy e ao Jorge Adilio que me deram o mapa de nossa amizade.


Seguimos aquí na missão, felizes por ter te homenageado em vida, por ver cada lágrima de alegria ter rolado do seu rosto por emoção e gratidão.
Agora, você é encantado.
Tudo se acabou saudade ficou brincando nas ruas, confetes ficaram jogados tão lindos esperando o bloco do adeus passar.
Adeus Vandico.
Tocarei, cantarei e beberei por você!!!!!
“Pede uma cachaça, pede um tira-gosto, bebê mais desgosto e se vai embora, agora vai-se embora que é pra descansar”

Vandico durante a apresentação do Candongueiro
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