Por: Maria A. Neves
O município de Ouro Preto mais uma vez se organiza para festejar o aniversário da sua elevação ao status de vila e como não poderia ser diferente, a Paróquia de Nossa Senhora do Pilar, juntamente com as Irmandades, Ordens Terceiras e demais associações religiosas da cidade estarão celebrando, com júbilo, mais um ano da presença da Padroeira da cidade de Ouro Preto. E nesse ínterim de Religião – Memória e História, percebe-se que a descoberta do lugar, a escolha da Padroeira e a criação da primeira Câmara de Vereadores caminharam paralelas e permanecem juntas nas comemorações do dia 8 de julho, em todos anos. Afinal, desde os primeiros tempos da sua formação, figurou entre outros, o nome de Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto.
A chegada da Bandeira de Antônio Dias de Oliveira à região em 24 de junho e a percepção de que haviam em fim, atingido o local, onde já havia notícias da existência de um pico, o qual recebera o nome de Itacolomi, em cuja proximidade foram descobertas as primeiras pepitas do “ouro preto”. Propiciando assim, a vinda de povos de muitos cantos e recantos de todo o Reino Português e de outros reinos, cada qual com sua bagagem material e imaterial e muitos deles já com seus escravos, em busca do precioso metal.
Ao mesmo tempo em que crescia os achados do ouro, aumentava a população e, advinham problemas de abastecimento (longas distâncias, intempéries, roubos, desvios de cargas, altos preços) e não tardou a chegada da fome por volta de 1700, propiciando a expansão do novo espaço pelos arredores, com a construção de fazendas para abastecimento agrícola, originando novas freguesias, aplicações e povoados, que posteriormente se tornaram, distritos e subdistritos.
Enquanto isso, afirmava-se também a ideia religiosa, celebrações em altares portáteis até o levantamento das primeiras capelas construídas rusticamente de pau a pique, cobertas de capim e posteriormente transformadas em templos maiores. Havia necessidade de expandir o cristianismo, manter a fé e as devoções trazidas pelos recém-chegados. Como também, batizar os inocentes recém-nascidos, os escravos crianças e adultos, celebrar os casamentos, ministrar sacramentos aos doentes, encomendar, sepultar e sufragar os mortos. O temor de que a alma não descansaria e ficaria vagando, se o corpo não recebesse os sacramentos, descansasse em espaço sagrado e recebesse os sufrágios necessários, amedrontava a maioria dos viventes.
Observa-se logo os primeiros agrupamentos, não só na área urbana da vila, como também nos seus arredores. Principiando então, a organização política, social e urbana de Vila Rica.
A oito de julho de 1711, cria-se a primeira Câmara de Vila Rica, apenas 13 anos após a chegada da Bandeira de Antônio Dias de Oliveira. Vê-se que tudo transcorreu num espaço de tempo bem curto, porém bastante agitado em termos de movimentação social, religiosa e política.
Surgem então as primeiras Freguesias, que já contavam com número de fregueses suficientes para elevação das primeiras matrizes, não só na área urbana da vila, como também nos seus arredores. Afinal havia que se registrar os que nasciam, se casavam e também aqueles que partiam para a vida eterna.
Além das Freguesias de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto e Nossa Senhora da Conceição do Antônio Dias, os demais espaços foram se definindo, os arraiais e aplicações com nomes diversos foram se destacando. Em Vila Rica, registra-se Bom Sucesso, Padre Faria, Alto da Cruz, Taquaral, Barra, Caquende e outros. Os morros também vão sendo nomeados à medida que a mineração se expandia e a urbe crescia: Morro de Santa Quitéria, marco divisor das duas principais Freguesias, Morro São João, Morro de São Sebastião do Ouro Podre, Morro de Santa Anna, Morro da Piedade. Principia também os nomes das primeiras ruas, sendo as Ruas Direitas da Câmara, as principais.
Nos arredores percebe-se também várias Freguesias com nome de santos e santas, Santo Antônio de Casa Branca, São Bartolomeu, São Gonçalo do Tijuco, São Julião, Nossa Senhora de Nazareth de Cachoeira do Campo, Nossa Senhora da Lapa de Antônio Pereira e outras. Em cada freguesia a matriz foi agregando um número de Aplicações, em geral de caráter devocional com um órgão específico:
Construção dos templos religiosos
Decorrido os primeiros anos havia que se atender a demanda do crescente povoamento, as pequenas capelas já não comportavam o número de fiéis e a reconstrução se tornava imprescindível. Para tal empreendimento, havia que se contratar profissionais de ordem variada e levantar fundos financeiros. Dessa forma, as irmandades vão ser essenciais, para a construção dos templos religiosos, criação e manutenção das celebrações e festas em louvor aos santos padroeiros e das diversas devoções. E, à medida que as capelas iam surgindo, também as Irmandades foram ocupando seus espaços, não só nos templos religiosos, mas também nas celebrações externas.
Elevação das Capelas ao Status de Matriz
A elevação das capelas à condição de matrizes demandava organização de pessoas para reconstruir, ornamentar e equipá-las para as celebrações. E, embora a Coroa Portuguesa reservasse verbas específicas para a construção das matrizes, nota-se um grande empenho para levantamento do capital necessário para tal. As capelas filiais não contavam com esse privilégio, exigindo ainda mais empenho para suas construções. E a sociedade cristã, já com um histórico de associações religiosas nos vários espaços, vão se agrupando em irmandades, conforme a necessidade, a identificação devocional e o grupo social ao qual pertencia. No entanto, a criação de cada uma delas demandava autorização eclesiástica local e diocesana. Cada uma delas tinha o seu Compromisso, seus Administradores e as suas obrigações religiosas, bem como, critérios para seu funcionamento.
Dessa forma, a Vila Rica dos primeiros tempos criou juntamente, com a Igreja Católica e a sociedade da época um complexo sistema religioso, com celebrações simples e festivas variadas, muitas das quais se mantiveram ao longo dos séculos, chegando até os nossos dias com inúmeros aspectos devocionais, intensas demonstrações de fé e intensa beleza artística e histórica.
Ouro Preto, 8 de julho de 2024.
Foto: Luccas Castro