Nesta segunda-feira (25), Mariana recebeu o governador do estado de Minas Gerais, Romeu Zema, em uma celebração para que ele e sua equipe explicassem quais seriam os rumos do dinheiro a ser recebido pela Repactuação do Novo Acordo de Mariana. O evento aconteceu na Praça Minas Gerais e contou com a presença de representantes do poder público.
Durante seu discurso, Zema ressaltou o quão trabalhoso foi o Acordo: “Para mim, prefeito, esse dia, esse momento aqui tem um significado muito, muito grande. Porque há exatamente 30 dias atrás, nesse momento eu estava em Brasília celebrando a assinatura do acordo da tragédia de Mariana. Esse acordo teve um custo muito, muito grande em termos de trabalho. Foram mais de 300 reuniões”, destacou o governador.
Além disso, o governador comparou a situação com a de Brumadinho. De acordo com ele, o caminho traçado na resolução dos danos foi diferente de Mariana: “Eu estava no meu primeiro ano de governo ainda, nós falando ‘não podemos deixar acontecer com Brumadinho aquilo que aconteceu com Mariana. Naquela época, depois de 3 anos, não tinha sido reparada em nada. E, apesar de Brumadinho ter acontecido bem depois, muitas obras já foram concluídas e estão em execução, o que mostra que o caminho que nós percorremos foi muito mais satisfatório e adequado. E por isso mesmo nós falamos: ‘nós temos de acabar com essa Fundação Renova, que já consumiu 35 bilhões de reais e quase nada trouxe de desenvolvimento para a região.”
O principal assunto abordado foi a duplicação do trecho da BR-356 nomeado como Lote 7. Esse trecho liga Belo Horizonte até a cidade de Rio Casca, passando por Mariana, Ouro Preto e Itabirito. A demanda de melhorias na rodovia é antiga, uma vez que o índice de acidentes e mortes aumenta ao decorrer dos anos.
Durante a cerimônia, o governador assinou um documento chamado despacho governamental, ou seja, declarando e firmando um compromisso em dar prosseguimento ao assunto: “E essa estrada, a BR-356, é uma estrada que vai mudar por completo toda essa região de Ouro Preto, Mariana, Ponte Nova e toda essa região que vai passar a ter um desenvolvimento muito maior. Eu atendo muitos investidores, muitos empresários que querem investir em Minas Gerais e a grande maioria deles fala ‘nessa região eu não invisto porque a estrada está congestionada, quando tem um acidente a estrada fica interrompida.’ (…) E com essa duplicação, esse problema será totalmente equacionado. Além, é lógico, de maior conforto, maior segurança, não é só facilidade no fluxo.”
O prefeito eleito Juliano Duarte relatou o que acredita ser uma indenização justa: “O rompimento da Barragem do Fundão em 2015 devastou vidas, destruiu comunidades e deixou marcas profundas em Mariana e em toda a Bacia do Rio Doce. É essencial que os debates sobre a reparação não percam de vista dois pilares fundamentais: a necessidade de indenização justa para a população atingida e investimentos adequados para o desenvolvimento da cidade de Mariana e região. A tragédia de Mariana impactou milhares de famílias, muitas das quais perderam seus lares, sua terra e até seus meios de sustento. Por isso, a indenização dessas pessoas não é apenas uma questão financeira, mas uma questão de dignidade. É inaceitável que, após tantos anos, nove anos, muitas vítimas ainda aguardam por justiça por uma compensação que reflita de maneira justa aos danos sofridos. Uma indenização justa deve levar em conta não só apenas as perdas materiais, mas também os danos imateriais. O trauma psicológico, a ruptura dos laços comunitários e os impactos nas gerações futuras”, afirmou.
O processo até a obra a partir de agora conta com duas audiências públicas a serem realizadas em dezembro deste ano. No primeiro semestre de 2025 será lançado um edital de obras e concessão e o contrato está previsto para ser assinado no segundo semestre, já iniciando as obras no ano que vem.
De acordo com o secretário de Estado de Obras e Infraestrutura, Pedro Bruno Barros, o valor previsto de investimento é de 5 bilhões de reais, sendo deles 2 bilhões da repactuação. Dessa forma, os outros 3 bilhões serão custeados pela empresa privada que receber a concessão. É previsto pelo secretário que a obra resulte em uma diminuição de 38 minutos no trajeto entre Belo Horizonte e Mariana.
A maior preocupação em relação à duplicação da rodovia parte de representantes municipais e também da população marianense sobre a cobrança de pedágios no trecho. Juliano Duarte ressalta a sua desaprovação em relação a isso: “O pedágio seria uma injustiça, pois colocaria o ônus de uma obra que teve medida de reparação diretamente sobre os ombros da população. Esse tipo de cobrança contraria o princípio da justiça, que deve nortear todo o processo de reparação.”
O deputado federal e ex-prefeito de Mariana, Duarte Junior, considera a duplicação da rodovia um ponto positivo na repactuação: “Eu acho que os municípios precisam de uma atenção especial. Vamos falar de Ouro Preto. Ouro Preto está recebendo um valor de 130 milhões em 20 anos. É totalmente incoerente com tudo que a cidade sofreu. (…) Então eu particularmente tenho minha crítica em relação aos municípios. Já externei isso aos governadores, ao governo federal e acho que a gente tem que lutar. É claro que tem benefícios, o qual participei, lutei e sei que vão se tornar realidade, como a duplicação e a terceira via. Isso é sensacional. A nossa defesa agora é que a nossa região não pague o pedágio.”
Durante a coletiva de imprensa, o governador reafirmou a importância da obra: “Essa obra é uma obra importantíssima, já que nós estamos falando de uma rodovia congestionada, perigosa, lenta e vai trazer desenvolvimento, segurança e conforto para quem mora aqui nessa região e, principalmente, vai trazer desenvolvimento econômico. (…) Hoje nós estamos dando aqui o pontapé inicial através da BR-356. E esse acordo só foi possível porque nós mostramos que aquilo que nós fizemos relativo à tragédia de Brumadinho funcionou muito melhor do que a Fundação Renova. A tragédia de Brumadinho já deu e já está dando frutos e a tragédia de Mariana, mesmo que com atraso de 9 anos, que foi agora dia 5 de novembro que completou, começa a dar os primeiros frutos a partir de agora. E um ponto muito importante, com escuta dos atingidos”, ressaltou Zema.
Quando questionado sobre os pedágios, o governador declara ser muito cedo para definir: “Primeiro, é muito prematuro, né? Agora que a obra vai começar a ser analisada, não há nem um trajeto definido. Teremos as audiências públicas exatamente para poder discutirmos como será feito, como será cobrado, se será cobrado ou não.”
“Esse governo não me representa”
Em contrapartida à celebração, os atingidos, juntamente com o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e o Revida Mariana, manifestaram na entrada da cerimônia. No microfone, Simone Silva, moradora e atingida de Gesteira, afirmou “Fora Zema!” e ainda declarou que “2026 é logo ali” e que os atingidos não esqueceriam de tudo que estava sendo feito pelos representantes.
Mônica Santos, atingida de Bento Rodrigues, relatou sua indignação: “Mais uma vez, as comunidades atingidas, os atingidos sofrem mais um golpe, né? Porque fizeram essa repactuação sem a nossa participação. E hoje, na cidade do epicentro do crime, o governador vem falar sobre o que vai ser feito com o dinheiro da repactuação. E mais uma vez, fomos impedidos de ouvir o que ele tinha para dizer. Então, assim, é lamentável o que aconteceu aqui hoje. Porque se o evento era para a população de Mariana, para as comunidades atingidas, a gente não pode entrar. Então, assim, que evento é esse? Que governo é esse? Que participação é essa? Uma vez estão decidindo a nossa vida sem a nossa participação e sem nos ouvir. E me disseram que na fala do secretário do governo do governador foi dito que as populações atingidas foram ouvidas. Dessa forma que aconteceu aqui hoje que a gente foi ouvido? Isso é ter participação? A gente está aqui com uma caixinha de som que vocês, que estavam lá, nem sequer conseguiram ouvir o que a gente estava dizendo. Isso é a participação que foi que teve em toda repactuação, em todos esses 9 anos. Então esse governo não me representa.”
Por Marcella Torres
Fotos: Carol Pessoa